terça-feira, 26 de agosto de 2014

Assistência obstétrica perde 60 leitos na rede pública

Por Tâmara Albuquerque, repórter da Gazeta de Alagoas (matéria publicada na edição de 17.08.14 - Especial sobre a saúde em Alagoas)
 
Maria Fabiana da Silva Santos passou pelas maternidades Nossa Senhora da Guia e do Hospital do Açúcar, antes de dar entrada na superlotada maternidade do Hospital Universitário, no dia 26 de julho. Com perda de líquido amniótico aos oito meses de gestação e uma infecção por causas ainda não identificadas, aguardava os resultados de exames e o momento de ter o bebê deitada em uma maca, instalada no corredor do setor de pré-parto.
“Não tinha leito e tive de ficar aqui. Acho que vou fazer uma cesariana, mas o médico está esperando desocupar uma cama na maternidade. Estou sentindo dor, mas não é de contração, é dor nas costas por causa dessa maca. Aqui no corredor é muito ruim”. Há dois dias internada, a paciente é acompanhada de perto pelo marido Robson da Silva, que está dormindo no chão, ao lado do leito improvisado.
O fechamento da Maternidade Escola Santa Mônica, em Maceió, ainda que temporário, fez Alagoas regredir na já debilitada assistência obstétrica oferecida às usuárias da rede pública, que dispõe de 917 leitos para internamento, segundo indicadores do Ministério da Saúde/Datasus. No mês de maio, foram desativados 60 leitos que pertenciam àquela unidade, para que sua estrutura física entrasse em reforma, ainda sem previsão de ser concluída.
A Santa Mônica foi transferida para as instalações do Hospital Universitário com uma parcela de funcionários da área médica, enfermagem e administrativa, além de equipamentos e leitos das suas unidades neonatais [UTI e UCI]. Mas os 60 leitos obstétricos permaneceram em sua sede. Desde então, a possibilidade da gestante de alto risco ter um parto humanizado e em condições dignas foi reduzida.
“A gente sempre trabalhou no Hospital Universitário com superlotação na UTI e UCI neonatais, mas havia vaga para receber a gestante. A nossa superlotação ocorria exatamente quando as maternidades que atendem às gestantes de risco habitual [baixo risco] ou a própria Santa Mônica restringiam o atendimento. Hoje, nós absorvemos todas as pacientes de alto risco do Estado e não conseguimos mais atender à demanda. A superlotação é rotina”, informa a diretora da maternidade do HU, obstetra Lúcia Amorim.
Os 60 leitos da maternidade do HU estão diariamente e 24 horas ocupados. A necessidade levou o setor de pré-parto, que contava com 12 leitos, a receber macas e poltronas reclináveis [antes destinadas aos acompanhantes] para acomodar as pacientes nas enfermarias e ao longo do corredor.
É neste ambiente nada acolhedor que as gestantes vivem a expectativa do parto, a ansiedade que antecede um dos momentos mais importantes da vida da mulher. Maria Jordânia foi encaminhada à maternidade do HU no último dia 28, após sofrer um aborto espontâneo. Estava no quarto mês de gravidez, sentia-se saudável, mas nunca havia feito uma consulta de pré-natal. Como registrava um sangramento intenso, foi internada no HU e submetida a uma curetagem. Após o procedimento, a paciente deveria ter sido acomodada em um leito de enfermaria, onde seria medicada e acompanhada até receber alta hospitalar, após 24 horas, em média. Mas a superlotação no setor levou Jordânia ao corredor. Na manhã em que falou à reportagem, ela estava sendo examinada pelo plantonista, que se contorcia no espaço apertado e sem iluminação para executar um procedimento simples.
A doméstica Maria Everiane da Silva, de 19 anos, deu entrada na maternidade do Hospital Universitário na madrugada de 29 de julho, vinda do município de Porto Calvo. Gestante de risco e em crise hipertensiva, precisou ficar internada e foi acomodada em um colchão, no corredor do hospital, onde também já estava outra paciente. Prestes a parir, ela comentou que se sentia insegura vendo outras gestantes no corredor. “A gente se assusta com essa situação”.
Uma vez no corredor, com dores e sentindo constrangimento pela falta de privacidade, as reclamações são inevitáveis. “Lá não é local que a gente possa examinar porque as pacientes estão expostas; não tem estrutura para ligar equipamentos e auscultar o bebê. Tudo é dificultado. A superlotação também impede que a equipe cuide de cada uma como deveria e elas, muitas vezes, ficam se sentindo desprezadas. Ainda tem o agravante de aumentar as chances de infecção.
UMA LUZ
A diretora da maternidade do HU, Lúcia Amorim, cita um ponto positivo na situação caótica, após o fechamento da Santa Mônica. Segundo ela, a desativação dos leitos e a superlotação no HU impuseram o funcionamento efetivo das maternidades destinadas a atender pacientes de risco habitual, em Maceió. “Essas maternidades não davam o suporte que a gente precisava. O HU e a Santa Mônica, que são referências para gestantes de alto risco, acabavam recebendo pacientes que teriam um parto normal. Agora, a gente consegue encaminhá-las”.
Outra boa notícia é que também foi ativada a assistência obstétrica no Hospital Geral Professor Ib Gatto Falcão, em Rio Largo, que passou inclusive a fazer cesarianas. A assistência pública à gestante, em Maceió, é feita nas maternidades Nossa Senhora de Fátima (26 leitos obstétricos); Nossa Senhora da Guia (40 leitos obstétricos + oito leitos de UCI neonatal); Maternidade do Hospital do Açúcar (26 leitos obstétricos + cinco de UTI neonatal), e Casa Maternal Denilma Bulhões (10 leitos obstétricos), além da Santa Mônica (temporariamente desativada) e do Hospital Universitário.

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