Maceió – O primeiro contato do cidadão com o Sistema Único
de Saúde (SUS) deveria ocorrer nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs), os postos
de atendimento que ficam próximos aos locais onde as pessoas moram, trabalham e
estudam. Nestes locais, teoricamente, teriam acesso a ações para prevenir
doenças, a consultas clínicas e a encaminhamentos para exames, tratamento e
reabilitação.
Quando esse conjunto de ações, previsto na Política Nacional
de Atenção Básica, falha e não responde às necessidades do usuário, provoca uma
quebra na linha da assistência, que pode levar o paciente a situações de risco,
ao agravamento irreversível da doença, à urgência de uma cirurgia ou mesmo à
morte. Se a falha ocorre na assistência obstétrica, o problema intensifica a
gravidade, porque o risco envolve duas vidas: mãe e feto.
A obstetra Lúcia Amorim passou parte da vida profissional
fazendo atendimento em unidades da rede básica e hoje é diretora da maternidade
do Hospital Universitário. Para ela, a realização adequada do pré-natal é uma
das mais importantes ações básicas para reduzir fatores de risco que complicam
a saúde da mulher e do bebê. “O Ministério da Saúde preconiza seis consultas
pré-natais, no mínimo, mas quanto maior o número de consultas, maior a garantia
de gestação e parto seguros”, enfatiza a médica.
Em Alagoas, segundo demonstram os dados do Ministério da
Saúde, a assistência pré-natal não é feita de forma eficiente nem eficaz. Em
2011, pelo menos 59,28% das gestantes não fizeram o pré-natal com número de
consultas adequadas. Aliás, 6,02% dessas mulheres sequer passaram por uma
avaliação médica no período da gravidez. Outras 10,61% chegaram a fazer entre 1
a 3 consultas, e 42,65% foram avaliadas pelo especialista entre 4 e 6 vezes,
durante os nove meses de gestação, o que os médicos ainda consideram um
pré-natal deficiente.
Em 2013, Alagoas registrou a morte materna [ocorrida durante
a gravidez, parto, aborto e puerpério] de 24 mulheres, segundo dados da Secretaria
de Estado da Saúde.
BARREIRA
A grande barreira para fazer o pré-natal em Alagoas é conseguir a consulta médica na unidade básica, uma deficiência impactante e decisiva na transformação dessas mulheres em pacientes de alto risco. “A gente sabe que as gestantes precisam chegar aos postos de saúde na madrugada para pegar a ficha da consulta e, mesmo assim, sem garantia de que vão conseguir. Depois de tentar uma vez, duas vezes, elas ficam desestimuladas e desistem de ir ao médico”, comenta.
BARREIRA
A grande barreira para fazer o pré-natal em Alagoas é conseguir a consulta médica na unidade básica, uma deficiência impactante e decisiva na transformação dessas mulheres em pacientes de alto risco. “A gente sabe que as gestantes precisam chegar aos postos de saúde na madrugada para pegar a ficha da consulta e, mesmo assim, sem garantia de que vão conseguir. Depois de tentar uma vez, duas vezes, elas ficam desestimuladas e desistem de ir ao médico”, comenta.
A dificuldade de conseguir uma consulta fez Juliana Maria
Santos ficar até o quarto mês da sua primeira gravidez sem nenhum
acompanhamento médico. “A gente chegava no posto às 4h da madrugada para pegar
a ficha da consulta, que era no dia seguinte. Mesmo assim, só distribuíam entre
seis e oito fichas e, às vezes, não sobrava. Tinha gente que dormia lá porque a
marcação só era uma vez por semana” conta.
Paciente da unidade no bairro do Feitosa, ela diz que no
período do pré-natal não passou por nenhuma consulta com o médico, apenas com
enfermeiras. “Quando eu estava marcada para o médico, na quarta vez que
consegui a consulta, a bebê resolveu nascer”. A filha de Juliana nasceu
prematura de sete meses e estava há 15 dias internada na UTI quando foi
transferida para a UCI neonatal do Hospital Universitário. “Não sei exatamente
porque minha filha nasceu prematura. Eu não sentia nada de errado e me disseram
que os exames estavam normais. Tudo o que eu planejei para essa etapa da vida
foi mudado depois do parto prematuro. Se tivesse condições de ter feito um
pré-natal mais cedo, talvez evitasse isso”.
A falta de obstetras e profissionais de enfermagem
capacitados para o atendimento no pré-natal são os fatores que mais contribuem
para o atraso em relação à ida das gestantes ao consultório. “A infecção
vaginal ou infecção urinária, que são problemas mais corriqueiros nas grávidas,
podem avançar quando não tratadas e levar à ruptura da bolsa e ao trabalho de
parto prematuro, colocando a vida e a saúde do recém-nascido em risco” alerta a
médica.
O mesmo acontece com a diabetes gestacional e a hipertensão,
controláveis na gestação, mas que podem evoluir e descompensar a paciente,
agravando seu estado de saúde. “Todas essas patologias deveriam ser
diagnosticadas cedo e resolvidas na assistência básica, no posto de saúde, com
um pré-natal ao menos razoável. Desta forma, as gestantes deixariam de chegar à
maternidade de alto risco com edemas, convulsões e descompensadas”, assegura a
médica.
Em um município onde a assistência básica à saúde funciona
de forma adequada, a mulher que deseja ter filhos, segundo pontua a médica,
deve procurar o ginecologista para fazer o planejamento da gravidez. Nessa
consulta primária, ela será orientada e encaminhada para fazer exames básicos,
como citologia [para verificar ocorrência de infecção], exame para conferir a
glicose, a pressão arterial, sífilis e HIV, além de iniciar uma medicação
preventiva para que a gestação ocorra com tranquilidade. “A prescrição do ácido
fólico, por exemplo, é essencial para reduzir as chances de nascer um bebê com
doenças neurológicas”, diz Lúcia Amorim.
Com a dificuldade de acesso às consultas nas unidades
básicas, a gestante em Alagoas normalmente inicia o pré-natal tardiamente, no
período entre 13 a 16 semanas de gravidez. Além disso, esse atendimento sofre
interrupção pela dificuldade da marcação de consulta de retorno. Se durante a
gravidez a gestante tiver alguma intercorrência, como um pequeno sangramento,
dor ou infecção urinária, a situação complica porque as consultas extras são
raras. Nessas horas, muitas recorrem à automedicação ou vão procurar uma maternidade
em busca da consulta.
“Essa é a maior causa da superlotação nas triagens das
maternidades em nosso Estado. No Hospital Universitário, por exemplo, cerca de
80% das gestantes que dão entrada no serviço não ficam internadas. Elas
procuram o serviço para cuidar de alguma intercorrência”, informa. A médica
defende a presença de obstetras ou enfermeiras obstétricas nos postos de saúde,
especificamente para esses atendimentos emergenciais, evitando que a gestante
esperasse um mês ou mais pela próxima consulta do pré-natal.
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