Petrúcio Cerqueira, de 72 anos, madruga na fila do Posto João Paulo II, no Jacintinho, e reclama que é jogado de um lado a outro para agendar consultas
Por Erick Balbino, repórter da Gazeta de Alagoas (matéria publicada na edição de 17.08.14 - Especial sobre Saúde em Alagoas)
(Foto: Marcelo Albuquerque/Gazeta de Alagoas) |
Maceió – A noite foi cansativa para o cidadão José Luiz dos
Santos, de 56 anos. Na primeira hora do dia, ele já encabeçava a fila para se
consultar no Posto de Atendimento Médico do Salgadinho (PAM Salgadinho), no bairro
do Poço.
O sofrimento de José Luiz é rotina nos postos de saúde.
Madrugar para conseguir uma vaga faz parte da vida dos usuários do Sistema Único
de Saúde (SUS), na capital e no interior de Alagoas. Os enfermos sofrem com
doenças e humilhações.
“Uma hora da manhã eu já estava na porta do PAM para poder
me consultar. Faço tratamento de glaucoma há mais de cinco anos. Desta vez,
estou enfrentando a fila só para carimbar a minha receita e conseguir os
colírios necessários para dar continuidade ao meu tratamento”, disse José Luiz.
No Posto João Paulo II, no Jacintinho, a situação é pior. O
número de pacientes na porta da unidade quando o sol ainda está nascendo
assusta: são dezenas de pessoas de todos os lugares de Maceió, que enfrentam
frio, chuva e todos os perigos noturnos inerentes à cidade com a maior taxa de
homicídios do Brasil.
A dona de casa Liliane Thamires, de 24 anos, saiu de casa na
noite anterior para poder garantir um bom lugar na fila. “Não é a primeira vez
que preciso dormir na rua para conseguir ser atendida. Saí às 23h. O que mais
me deixa triste é saber que a entrega das fichas só começa às 13h. A espera
será longa”.
O aposentado Petrúcio Cerqueira, de 72 anos, chegou ao posto
de saúde às 5h30, com a esposa, Francisca Maria Cerqueira, de 64 anos. Vários
problemas de saúde, inclusive diabetes e pressão alta, não foram bem tratados,
ao ponto de forçar a amputação de alguns dedos do pé. Petrúcio também perdeu a
visão do olho direito.
“Estou vivo e acho que devo agradecer todos os dias por
isso, mas a luta é diária e muito sofrida. Confesso que já estou cansado de ser
jogado de posto em posto para agendar consultas e pegar remédios. Não estou
pedindo nenhum favor, só quero ter meus direitos garantidos e minhas consultas
agendadas”. Petrúcio tentava uma vaga para o cardiologista, mas teve uma
surpresa: o Complexo Regulador de Assistência (Cora), sistema responsável pelo
agendamento de consultas médicas em todo o Estado, não estava funcionando há
dias.
Francisca reclama da falta de comprometimento dos gestores
da saúde. “Prometi diante do padre que estaria ao lado do meu marido na saúde e
na doença, e estou tendo minhas palavras provadas agora. Infelizmente, ele não
pode andar mais sozinho e eu tenho que acompanhá-lo. Quando tudo começou, há
aproximadamente cinco anos, eu pesava 70kg. Hoje não passo dos 50”, disse dona
Francisca.
A diretora administrativa do Posto João Paulo II, Maria das
Dores, afirma que administrar uma unidade de saúde em Maceió é um verdadeiro
desafio. Precisa enfrentar, diariamente, a falta de funcionários e equipamentos
básicos. “Atualmente, trabalhamos com dois funcionários na recepção. Para
atender à quantidade de gente que procura o posto todos os dias seria
necessário, no mínimo, quatro”, desabafou.
Ao ser indagada sobre o porquê de as fichas serem entregues
unicamente no período da tarde, ela disse que se tratava de uma estratégia para
que as pessoas parassem de chegar na madrugada, à espera de um agendamento.
“Mesmo depois de transferir a distribuição de fichas para o
período vespertino, as pessoas continuam dormindo na porta do posto. Parece que
virou tradição esse tipo de comportamento”, informou Maria das Dores.
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